quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

ADOLESCENTES AFRICANOS COM HIV

A carga pesada dos adolescentes com Aids
Andela Milambo é uma zambiana de 16 anos que espera ter um marido para compartilhar a carga que é viver com HIV e para que a ajude cada vez que reaparece a herpes. Milambo, que contraiu o vírus da deficiência imunológica humana aos 6 anos, quer que alguém tome as decisões por ela, “enquanto leio revistas”, disse.

Por Zarina Geloo, para a agência IPS

Esta adolescente foi infectada pelo HIV (causador da aids) por uma agulha contaminada. Vive com medo de morrer por causa da doença, mas o pior é que cada vez que tem um episódio ativo de herpes tem dificuldade para caminhar, falar e comer.

Frequentemente falta na escola por “doenças menores” como resfriados, que costumam estar acompanhados de tosses complicadas que a debilitam. Tem notas ruins e pouca esperança de acabar o curso secundário no ano que vem. “Mas, tudo bem, de todo modo não pensava em ir à universidade”, diz, resignada.

A jovem não tem amizades duradouras por temer que fiquem sabendo que é portadora do vírus da Aids. Seus pais e outros familiares próximos, que conhecem sua situação, tentam apoiá-la, mas acabam piorando as coisas, afirmou. “Quando fico doente os vejo tão estressados que prefiro sofrer em silêncio”, disse.

Milambo conhece os preconceitos dos jovens sobre HIV e Aids, e a assusta o grau de discriminação e ignorância existente. “Nunca posso contar-lhes que sou portadora porque o estigma me mataria mais rápido do que a Aids”, ressaltou. A jovem inveja outras adolescentes que vão ao cinema, riem e dançam. Ela não tem tempo para isso porque precisa trabalhar para salvar sua vida. Em troca, dedica-se a coisas “aborrecidas”, com “educar seus pares” em uma clinica local.

A educação de pares é um tipo de intervenção que objetiva gerar comportamentos mais saudáveis entre os jovens, baseando-se no conceito de que os adolescentes são mais receptivos à opinião de seus iguais ou seus amigos do que de estranhos, e em especial por autoridades adultas. É irônico, reconhece. “Digo que me aborrece, mas a clinica é o lugar onde me sinto mais à vontade. Como educadora tenho vantagens e ninguém me faz perguntas. Recebo informação e tratamento gratuitos”, explicou. E também é o lugar onde a jovem procura um marido.

“Os homens da clínica estão informados e são cordatos porque trabalham com pessoas com HIV. Quando completar 18 anos vou escolher um”, assegurou. “Como chefe da casa, meu marido tomará todas as decisões sobre nosso bem-estar, enquanto assisto televisão e leio uma revista de modas. Estar casada me converterá em uma pessoa correta. Todo mundo quer se casar, pelo menos vou poder fazer isso”, disse.

James Banda também pretende levar uma vida normal. O jovem de 18 anos fala abertamente de sua condição e limita-se a sair com moças que também são portadoras do HIV porque odeia ter de explicar o motivo de tomar tantas pílulas com frequência. Costumam sair correndo”, disse.

“As que ficam agem como se fosse uma questão beneficente e eu me converto em sua boa obra de caridade cristã”, afirmou. Para Banda, que contraiu o vírus da Aids em sua primeira relação sexual, o objetivo é conseguir uma moça com quem ter filhos.

O jovem contou que depois de diagnosticado o HIV começou a fazer as coisas “segundo o manual. Fiz uma rigorosa terapia, falei aos quatro ventos e contei minha situação a todos que quisessem ouvir, fiz tudo”, contou. “Organizações não-governamentais me aplaudiram e me converti no rapaz com HIV do cartaz. Mas, depois de algum tempo, a novidade acabou e me cansei de falar sempre sobre a mesma coisa, como se isso fosse o que me definia”, acrescentou.

Algumas vezes gostaria de não ter de revelar sua condição, como quando vai a uma discoteca e as pessoas o alertam para não beber, falam que ele não deveria estar ali e que não “aprendeu a lição”. “Os livros sobre viver positivamente com HIV dizem que devo tentar levar uma vida o mais normal possível. Mas, a realidade é diferente. Minha vida nunca terá nada de normal”, lamentou.

As infecções oportunistas que costumam afetá-lo, ou sempre ter de estar atento para o surgimento de uma cura ou um tratamento melhor e não poder planejar nada para dentro de 10 ou 20 anos, são algumas das coisas que fazem com que sua vida não seja normal. Terminou os exames do secundário com distinção e no ano que vem irá à universidade, pois deseja ser contador. Banda tem o apoio da família, de alguns amigos próximos e boas perspectivas de futuro, mas ainda assim, ter HIV “é uma dura condenação”, reconheceu.

Por outro lado, para Adam Malik é um sofrimento guardar o segredo. Beber bastante até perder “os sentidos, de vez em quando”, é a forma que tem este zambiano de origem indiana para lidar com a situação. Malik vive em uma comunidade muito fechada que se nega a reconhecer o HIV em seu entorno e estigmatiza abertamente os portadores.

Aos 18 anos, Malik sabe muito bem disso, e por essa razão seus pais não sabem que contraiu o vírus aos 14 anos. Foi contagiado por uma empregada doméstica com quem manteve relações sexuais durante um ano. Somente há muito pouco tempo começou a receber tratamento.

Como sempre foi uma pessoa tranquila e solitária, ninguém nota quando está deprimido ou não se sente bem. Não tem nenhuma das típicas infecções oportunistas que costumam atacar os portadores do HIV. “Guardar este segredo é uma carga muito pesada. Tenho dor de cabeça por causa da tensão e estou com um tic nervoso devido ao estresse”, disse Malik.

O jovem contou que tem sorte de Zâmbia contar com bom sistema de distribuição de antirretrovirais (são medicamentos que reduzem a carga do HIV no organismo e permitem melhorar e prolongar a vida do paciente) e ficou surpreso com a facilidade com que pôde integrar-se ao programa. Escolheu uma clínica distante para que ninguém o reconhecesse.

O rapaz se mantém informado sobre os novos tratamentos, mas não consulta nenhum psicólogo por medo de ser identificado. Malik também tem medo de que lhe peçam para participar de alguma conferência sobre Aids por ser um jovem indiano com HIV. “Para os ativistas seria uma novidade impossível de resistir. Eu seria mostrado como um troféu. Isso aconteceu com muitos jovens que decidiram revelar sua condição”, acrescentou.

Aparentemente sua vida não mudou. Continua sendo bom filho, leva a mãe e as irmãs às compras, ajuda o pai no negócio da família e sai com seus amigos na sexta-feira à noite. Dentro de pouco tempo escolherá uma esposa e supõe que terá de ter filhos. O futuro lhe causa muita angústia. “Minha mãe morre se souber que tenho HIV. Meu pai me poria para fora de casa. As possibilidades de minhas irmãs terem um bom casamento iriam por água abaixo. Quando penso nisso, me embebedo para esquecer”, contou. Malik sabe que isso compromete a eficácia do tratamento, mas é a única forma que tem para lidar com essa questão. “Tenho medo”, reconheceu.

Fonte: vermelho.org.br

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